Split Payment: Entenda a Nova Era da Gestão Tributária para sua Empresa

André Tenório, 23 de julho de 2025.

A introdução do Split Payment representa uma das mudanças mais significativas no cenário tributário brasileiro, com o objetivo de otimizar a arrecadação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Esta nova sistemática transformará a forma como as empresas gerenciam seus recebimentos e obrigações fiscais, impactando diretamente os fluxos de caixa e os processos operacionais. Para empresários e gestores, compreender os detalhes e as implicações dessa implementação é crucial para assegurar a conformidade e manter a saúde financeira de seus negócios.

Este artigo visa desmistificar o Split Payment, explicando suas modalidades, o processo de implementação e, mais importante, os impactos práticos que sua empresa sentirá no dia a dia, tanto na esfera operacional quanto na gestão financeira e contábil.

O Que é o Split Payment e Suas Modalidades

Em sua essência, o Split Payment é um mecanismo que determina a segregação e o recolhimento do IBS e da CBS diretamente na fonte, no momento da liquidação financeira de uma transação. Isso significa que, em vez de o valor total da venda ser repassado ao fornecedor e este, posteriormente, recolher os tributos, as parcelas correspondentes ao IBS e à CBS são retidas pelos prestadores de serviços de pagamento eletrônico ou pelas instituições operadoras de sistemas de pagamentos e direcionadas aos órgãos competentes.

A legislação prevê duas modalidades principais para a aplicação do Split Payment: o procedimento padrão e o procedimento simplificado.

O Procedimento Padrão

O procedimento padrão é a regra geral para a segregação e recolhimento dos tributos. Nele, o fornecedor tem a obrigação de incluir no documento fiscal eletrônico informações detalhadas que permitam a vinculação da operação com a transação de pagamento, bem como a clara identificação dos valores de IBS e CBS incidentes. Essas informações devem ser transmitidas aos prestadores de serviço de pagamento, seja pelo próprio fornecedor, por uma plataforma digital que intermediou a transação ou por outra entidade que receba o pagamento.

Antes que os recursos sejam disponibilizados ao fornecedor, o prestador de serviço de pagamento consultará um sistema gerido pelo Comitê Gestor do IBS e pela Receita Federal do Brasil (RFB). Essa consulta visa determinar os valores exatos a serem segregados e recolhidos, considerando a diferença positiva entre os débitos destacados no documento fiscal eletrônico e as parcelas que porventura já tenham sido quitadas. Caso a consulta ao sistema não possa ser realizada, o prestador de serviço de pagamento fará a segregação e o recolhimento com base nas informações recebidas, cabendo ao Comitê Gestor e à RFB calcular o valor correto e transferir qualquer excesso ao fornecedor em até três dias úteis.

O Procedimento Simplificado

Existe também a possibilidade de um procedimento simplificado, que pode ser adotado por contribuintes em operações onde o adquirente não seja contribuinte do IBS e da CBS no regime regular. Neste caso, os valores do IBS e da CBS a serem segregados são calculados com base em um percentual preestabelecido do valor da operação.

Esse percentual será definido pelo Comitê Gestor do IBS e pela RFB, podendo ser diferenciado por setor econômico ou por contribuinte, e não necessariamente guardará relação com o valor exato dos débitos incidentes na operação. A opção por esse procedimento é irretratável para todo o período de apuração. Os valores recolhidos por meio do procedimento simplificado são utilizados para quitar débitos não extintos do contribuinte, seguindo uma ordem cronológica dos documentos fiscais. Similar ao procedimento padrão, se houver valores recolhidos em excesso, o Comitê Gestor e a RFB farão a transferência do montante excedente ao fornecedor. É importante ressaltar que o Poder Executivo poderá determinar o uso do procedimento simplificado em situações em que o padrão ainda não esteja plenamente funcional para os principais instrumentos de pagamento eletrônico.

O Caminho para a Implementação: Etapas e Desafios

A implementação do Split Payment é um processo complexo que envolve a adaptação de sistemas, a definição de regulamentações e a capacitação de todos os agentes envolvidos. A segregação e o recolhimento do IBS e da CBS ocorrerão na data da liquidação financeira da transação, observando os fluxos de pagamento. Em vendas parceladas, a segregação e o recolhimento serão feitos proporcionalmente em cada liquidação de parcela. A antecipação de recebíveis, por sua vez, não altera a obrigação de segregação.

O Poder Executivo e o Comitê Gestor do IBS terão um orçamento específico para o desenvolvimento, implementação, operação e manutenção do sistema do Split Payment. A expectativa é que o Split Payment entre em funcionamento simultaneamente para os principais instrumentos de pagamento eletrônico utilizados em operações com adquirentes não contribuintes. Contudo, a legislação prevê uma implementação gradual, e atos conjuntos do Comitê Gestor e da RFB poderão definir hipóteses em que a adoção do Split Payment será facultativa.

Os principais desafios esperados na implementação incluem:

  • Adaptação Tecnológica: A necessidade de sistemas robustos e integrados, tanto por parte dos órgãos governamentais (Comitê Gestor e RFB) quanto dos prestadores de serviços de pagamento e das próprias empresas, para garantir a correta transmissão de dados fiscais e a efetiva segregação dos valores.
  • Integração de Dados: A vinculação precisa entre documentos fiscais eletrônicos e as transações de pagamento é um ponto crítico que exigirá ajustes nos sistemas de faturamento e vendas das empresas.
  • Comunicação e Padronização: A clareza nas diretrizes para a transmissão de informações e a padronização dos processos serão fundamentais para evitar erros e retrabalho.
  • Transição e Treinamento: O período de transição demandará um esforço significativo em treinamento para que as equipes compreendam as novas regras e operem os sistemas adaptados de forma eficiente.

Impactos Operacionais e Administrativos no Dia a Dia da Empresa

A chegada do Split Payment trará mudanças profundas na rotina operacional e administrativa das empresas. O fluxo de caixa será o primeiro ponto a sentir o impacto, uma vez que a parcela dos tributos será retida no ato do recebimento, e não mais em uma data de vencimento posterior.

Nos Processos Operacionais:

  • Emissão de Documentos Fiscais: Haverá uma necessidade ainda maior de precisão na emissão de documentos fiscais eletrônicos, que deverão conter as informações detalhadas do IBS e da CBS para a correta segregação. Qualquer divergência poderá gerar problemas na liquidação.
  • Transmissão de Informações: As empresas precisarão garantir que seus sistemas estejam aptos a transmitir os dados fiscais relevantes de forma ágil e correta aos prestadores de serviços de pagamento.
  • Recepção de Pagamentos: A empresa receberá o valor líquido da venda, já deduzido dos tributos. Isso exige um monitoramento constante e a capacidade de reconciliar os recebimentos com as obrigações fiscais já quitadas na fonte.
  • Gestão de Excedentes: Em casos de recolhimento a maior (especialmente no procedimento simplificado ou falha de consulta), a empresa precisará ter processos para acompanhar e receber de volta esses valores excedentes dos órgãos competentes.

Nos Processos Administrativos:

  • Aumento da Fiscalização Interna: A conformidade com as novas regras exigirá um controle administrativo mais rigoroso sobre as operações de venda e seus respectivos pagamentos.
  • Reconciliação e Conferência: A equipe administrativa terá um volume maior de trabalho na conciliação dos extratos bancários com os valores segregados e recolhidos, assegurando que tudo esteja em ordem.
  • Treinamento de Equipes: Será indispensável capacitar as equipes de vendas, financeira e contábil sobre os novos procedimentos, garantindo que todos compreendam suas responsabilidades.
  • Adequação de Sistemas: O planejamento e a execução de adequações em sistemas de gestão (ERPs), faturamento e contabilidade serão prioritários para automatizar e otimizar os novos fluxos de trabalho.

É importante frisar que, embora os prestadores de serviços de pagamento e as instituições operadoras de sistemas de pagamento sejam responsáveis por segregar e recolher os valores, eles não serão responsáveis tributários pelo IBS e pela CBS incidentes sobre as operações que liquidam. A responsabilidade final pelo pagamento do eventual saldo a recolher dos tributos permanece com o sujeito passivo.

A Nova Dinâmica da Gestão Financeira e Contábil

O Split Payment altera fundamentalmente a dinâmica da gestão financeira e contábil das empresas, exigindo uma visão mais estratégica e proativa.

Na Gestão Financeira:

  • Impacto no Fluxo de Caixa: A principal mudança é a alteração do momento da saída dos tributos. Em vez de provisionar e pagar o IBS/CBS em datas específicas do mês seguinte, uma parte do valor da venda será retida imediatamente. Isso pode exigir um replanejamento do capital de giro e da liquidez da empresa.
  • Previsão de Caixa: A precisão na previsão de caixa se tornará ainda mais crucial. Os gestores financeiros precisarão incorporar a segregação imediata dos tributos em suas projeções para evitar surpresas e garantir a disponibilidade de recursos para outras despesas.
  • Gestão de Contas a Receber: A gestão de contas a receber também se transformará, pois os valores líquidos serão diferentes dos valores brutos faturados. A conciliação bancária será um processo mais detalhado.

Na Gestão Contábil:

  • Registro Contábil: A contabilidade precisará adaptar seus registros para refletir a segregação dos tributos na fonte. Possivelmente, novas contas ou subcontas serão criadas para espelhar essa operação, garantindo a rastreabilidade e a transparência.
  • Apuração de Impostos: Embora parte dos impostos seja recolhida na fonte, a apuração completa do IBS e da CBS ainda será necessária para verificar se há saldo a pagar ou a restituir, considerando créditos e outras compensações. A contabilidade será responsável por essa conferência final.
  • Conciliação Tributária: A conciliação entre os valores recolhidos via Split Payment e as obrigações fiscais apuradas será uma tarefa rotineira, vital para a conformidade e para a correta escrituração dos livros fiscais.
  • Auditoria Interna: Os processos de auditoria interna precisarão ser revisados para incorporar os novos fluxos de informação e os controles relacionados ao Split Payment, assegurando a integridade dos dados fiscais e financeiros.

Conclusão

O Split Payment representa uma evolução no sistema tributário, visando maior eficiência na arrecadação e combate à sonegação. Para as empresas, contudo, é um divisor de águas que exigirá adaptabilidade, planejamento e investimento em tecnologia e capacitação. Compreender as modalidades (padrão e simplificado), antecipar os desafios de implementação e ajustar os processos operacionais, administrativos, financeiros e contábeis são passos indispensáveis para navegar com sucesso nesta nova era. Preparar-se agora é fundamental para garantir a conformidade, otimizar o fluxo de caixa e manter a competitividade no mercado. A colaboração entre os setores financeiro, contábil, de TI e operacional será a chave para uma transição suave e para o pleno aproveitamento das novas regras.

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